16 de novembro de 2011

Esquina qualquer

by Ana Paula de Almeida às 22:00

E quem diria que naquela esquina deserta da cidade eu encontraria você. Eu, que sempre chorei vendo comédias românticas e que sonhava em um dia encontrar meu amor numa esquina qualquer. Aconteceu. E eu esperei tanto por isso que já tinha até frases prontas, sorrisos ensaiados e gestos pré-programados. Eu iria sorrir, pegar na tua mão e dizer "Eu sabia que ainda te encontraria". Mas foi tão diferente de tudo que eu tinha sonhado. A esquina que eu te encontrei não tinha flores nem cores de fotografia antiga. Era fria, deserta e eu andava rápido porque tinha medo de andar naquele bairro. E você não vinha a pé, vinha de bicicleta. E me atropelou. Ah, quando eu lembro eu dou tanta risada. Dou mais risada ainda porque minha primeira reação foi de que você seria um trombadinha. Na verdade você era, um assaltante, que roubou meu coração. Ai que brega, mas é a verdade você sabe. Tava tão frio aquele dia, que quando eu caí, não sabia se ofegava de medo, se tremia ou se te xingava. Meu coração foi a mil por hora, e não foi de amor não, foi de medo. E você ria de mim! Ria descontroladamente. E eu comecei a chorar, de raiva, de nervoso, de vergonha, de vontade de te bater. Eu ensaiei milhares de palavrões, mas só conseguia tremer de frio e de medo. E você, rindo de mim.
Se eu tivesse pensado bem, não poderia nunca ter me apaixonado por você. Você me atropela, numa bicicleta, e ainda fica zombando do meu medo. Mas hoje quando eu lembro, ou quando você me relembra, eu rio tanto que até choro. Lembra do que aconteceu depois? Você me levantou e me abraçou. E me disse que eu não precisava ficar com medo, você não iria me machucar, e se eu quisesse, ainda me levava no hospital que era ali pertinho. Com a cabeça encostada no teu peito eu me senti protegida. Como nunca havia me sentido antes. E o seu perfume amadeirado me deu uma sensação de aconchego. Eu tava me sentido bem afinal, depois do susto. Mas ainda estava com raiva de você. Que babaca, me atropela, zomba de mim, e me abraça como se eu fosse uma qualquer! Olha só! Eu só queria ir embora, eu só queria sair correndo, mas não conseguia me desvencilhar dos seus braços. Que sensação estranha. Estranhamente deliciosa.
A gente foi caminhando um pouco e você me contou sua história. Tava ali de bicicleta porque gostava de sair pra relaxar sozinho, sem rumo. Graças a Deus não era nenhum trombadinha! Era formado, empregado, e gente de bem. Na verdade eu me senti mais tranquila depois disso. Até esqueci que estava naquele bairro perigoso, afinal. Até parei de tremer, de medo e de frio. E eu fui te contando a minha história.
E a gente começou a construir uma história ali, naquela esquina. Aí você me levou em casa. E me abraçou de novo, e de novo eu senti aquela estranha sensação de que eu tinha encontrado um abrigo pra vida. E você me disse que era mais gostoso me abraçar quando eu não estava tremendo. E que o meu nariz vermelho era uma graça. E que aquilo tinha deixado minhas bochechas vermelhas, e que isso sim era uma graça. Aí você me beijou, e senti pela primeira vez que não tinha mais controle pelo meu corpo. Eu só queria ficar ali, com os seus braços fortes me sustentando. Parece que no cinza daquele céu nublado seus olhos ficaram ainda mais azuis. E cada dia que passava eles ficavam mais doces e familiares pra mim. E agora, eu os vejo daqui do fundo da igreja, pronta pra entrar, pra ser sua pra sempre. Não que eu já não fosse desde aquele "singelo" atropelamento na esquina do bairro perigoso. Mas agora é como nos meus ensaios pra vida, eu já tenho as palavras na ponta da língua pra te dizer, e a sua bicicleta não vai me assustar e me impedir de falar  "Eu sabia que ainda te encontraria, naquela esquina qualquer".

Ana Paula de Almeida

1 comentários:

Gabriela Castro on 17 de novembro de 2011 às 01:19 disse...

Eu acho que as coisas mais certas na vida da gente acontecem da maneira mais improvável.

Postar um comentário

 

napaulices Copyright © 2012 Design by Antonia Sundrani Vinte e poucos